segunda-feira, agosto 13, 2012

A Espada e a Pluma: um poema alegorico

A Espada e a Pluma: um poema alegórico na era das trevas

A espada é muito mais poderosa do que a pluma,
infinitas vezes mais poderosa, e de forma mais contundente.
A espada pode cortar quantas plumas quiser, à vontade;
a pluma não consegue vencer uma só espada, ainda que multiplicada em mil.

A espada corta, fere, penetra, rasga, decepa e esquarteja
a pluma não tem qualquer poder contundente nas coisas da matéria.
A espada impõe respeito, intimida, aterroriza e submete;
uma pluma mal consegue provocar cócegas nas pessoas.

A espada tem o poder de comandar vontades, mesmo contra a vontade;
a pluma, no máximo, só consegue influenciar as mentes, nunca os músculos.
A espada desperta a adrenalina, faz o coração bater forte, o sangue subir à cabeça;
a pluma, se tanto, conquista alguma consciência mais aberta aos conhecimentos.

A espada sempre vence, pelo argumento da força,
a pluma nem consegue se impor pela força do argumento.
A espada sempre tem razão, mesmo quando nenhuma razão tem,
a pluma pode até tê-la de sobra, mas a razão do mais forte é sempre a melhor.

A espada dobra os seres, pela sua presença cortante, definitiva;
a pluma busca converter consciências, mesmo ausente ou distante.
A espada não pede licença a ninguém: ela se instala, sem pedir permissão;
a pluma sempre tem de negociar alguma licença para se exercer.

A espada compra mercenários, torna os homens seus escravos;
a pluma é libertária, e quer sempre livrar as pessoas da opressão.
A espada manipula súditos, envia espiões, aprisiona os cortesãos;
a pluma pretende, apenas e tão somente, formar livres cidadãos.

Todos os impérios foram construídos na base da espada, do ferro e do fogo;
nenhum império ruiu apenas pela força da pluma, mesmo coalizada a outras plumas.
A soberania começa onde existe o monopólio da força por algum dono de espadas;
a pluma é anarquista, não quer deuses ou senhores; só promete autonomia.

A espada é o último argumento de defesa, e a última instância da liberdade;
mas ela também serve para dominar, mesmo o cidadão sem qualquer pluma.
A pluma pode gritar, mas o tilintar da espada fala mais alto, bem mais alto;
aliás, a espada não precisa dizer nada: o simples desembainhar já é um discurso.

A espada invade casas, destrói culturas, mata animais e outros homens;
a pluma não consegue mover um grão de centeio, não traz água, nem abrigo.
A espada impõe a ordem, lá onde reinava a mais perfeita desordem;
a pluma  contribui para a desordem, ao pretender desobedecer à espada.

A espada serve para resguardar viúvas e órfãos, os fracos e os indefesos,
mas também desperta ambições e cobiças desmedidas, sempre crescentes.
A pluma pode falar em prol dos de menor poder, dos desvalidos e dos ingênuos,
mas ela não impede a corrupção dos costumes e o roubo da riqueza alheia.

A espada alicia servidores, áulicos e até mesmo conselheiros emplumados,
mas ela não consegue dominar o que lhes vai nas mentes e sentimentos.
A pluma agita os corações, desperta vontades, cria novas aspirações,
mas ela não dá aos que a seguem qualquer alavanca ou motor de arranque.

A espada sempre predomina, mesmo quando o fio se desgasta e a visão fica míope;
a pluma sozinha não faz nada: precisa de um tinteiro e de um papel, ou pergaminho.
A espada é o prolongamento natural de mãos fortes, másculas, decididas;
a pluma hesita ao simples tracejar das letras, e só funciona com mentes atiladas.

E no entanto, e no entanto...
a espada enferruja, fica cega, e pode quebrar, num simples embate mais feroz.
A pluma é móvel, flutua com o vento, mesmo nas mais fortes tempestades,
Ela é mais durável que a espada, pois as palavras voam, e as ideias se transmitem...

Uma espada fere gravemente, mas uma ideia mergulha mais fundo.
A espada geralmente está nas mãos de mercenários e de esbirros a soldo,
as ideias só podem sobreviver e se disseminar na mais completa liberdade.
Espadas agridem a esmo; ideias possuem lógica, sentido, direção e propósitos.

Por mais fortes que sejam os braços, as pernas, por mais couraças e capacetes,
por mais afiadas que sejam as espadas, elas só podem alcançar um de cada vez.
Ideias, ao contrário, atingem todos e cada um, num raio de 360 graus,
elas perfuram os elmos mais duros, atravessam cotas do aço mais temperado.

Espadas enferrujam, guerreiros morrem ou ficam estropiados, desaparecem...
Ideias, se são boas, permanecem, por séculos e até milhares de anos, sempre jovens.
As ideias, finalmente, são mais fortes que as espadas, elas vencem as espadas.
Espadas deixam apenas destruição e morte; as plumas semeiam conhecimento.

Espadas, no fundo, têm inveja das plumas, queriam ser livres como as plumas,
não viver em coldres cheirando a sangue e a mofo, asfixiadas em couro velho.
As plumas são ágeis, leves, flexíveis; mudam de acordo com as circunstâncias;
plumas expressam o que de melhor a humanidade produziu, em todos os tempos.

Espadas têm ódio das plumas, pois nunca poderão ser o que estas são:
instrumentos de beleza, de saber e de conhecimento, de paixão e de ciência.
Espadas são instrumentos profundamente complexados, e com razão:
Elas estão do lado da morte e do sofrimento; as plumas são o eterno renascer...

sexta-feira, novembro 18, 2011

Minitratado das Dedicatórias - Paulo Roberto de Almeida


Minitratado das Dedicatórias

Paulo Roberto de Almeida

Sempre me intrigaram as dedicatórias, especialmente as estranhas (e, reparem bem, existem as mais bizarras). Afinal de contas, para um leitor inveterado como eu, impossível não tropeçar com elas bem no começo de um livro qualquer. Os bons autores, maridos dedicados, pais extremosos, amantes amantíssimos, nunca deixam de honrar seus amados, oferecendo-lhes a obra que você tem nas mãos, com palavras obsequiosas, atenciosas, gentis. Normal tudo isso.
Mas, depois de “enésima” tese ou dissertação acadêmica com que sou confrontado, em leitura primeiro, em banca depois, sou obrigado a me render a esta simples evidência: as dedicatórias são uma forma de arte como poucas outras, merecendo por isso mesmo o que aqui vai agora exposto: um minitratado.

De fato, eu há muito já vinha intrigado com esse tipo de exercício intelectual – desde os menores, de poucas linhas, até os maiores, de uma página e meia –, quando fui despertado para a importância da matéria por um colega de banca, que se lembrava de outra tese de doutorado, em Paris, na qual seu autor, jurista que depois ficou famoso, dedicou seu calhamaço à sua amada, de uma forma que ficou famosa antes dele conquistar respeito e apreço dos seus pares. De fato, o candidato em questão dedicava, o mais seriamente possível, sua tese a Marie Josephine (o nome eu escolho, para resguardar a privacidade dos personagens), “em memória do que aconteceu na tarde do dia 18 de junho de 19.., no jardim das bétulas...” e por aí seguia em mais duas ou três linhas de uma exemplar discrição amorosa. Mais do que a dedicatória em si, o que certamente intrigou os leitores foi tentar descobrir a natureza daquilo que tinha realmente acontecido naquela tarde de um final de primavera, no jardim das bétulas, entre o muito sério autor de um tratado de direito internacional e sua doce Marie Josephine. A imaginação não deixa de deslizar sobre o ocorrido naquelas poucas horas em lugar tão romântico e convidativo: c’est tout un programme, como diriam os franceses.

Bem, deixemos por enquanto os amantes franceses de lado para nos dedicar, de modo integral e completo, à arte das dedicatórias, no que elas merecem de atenção, de seriedade e de relevância acadêmica, justificando, quem sabe até?, uma tese de doutoramento, ou pelo menos uma dissertação de mestrado. Concordo. As dedicatórias são suficientemente reveladoras do espírito do autor, de suas condições de trabalho acadêmico, de suas influências intelectuais, para merecer um estudo à parte, um que interrompa a leitura de livros e cartapácios universitários logo nas primeiras páginas, desprezando todo o resto, apenas para ficar nas doces palavras com as quais o autor da obra em questão homenageia deuses, santos, padrinhos e amigos, chegando até ao sogro e à sogra (imaginem vocês!), não poupando nem mesmo o cachorro ou o papagaio. Candidatos à autoria de teses bizarras, apresentai-vos...

Os livros universitários americanos comportam poucas dedicatórias exclusivas; no máximo, uma frase de algum famoso escritor ou cientista, colocada em destaque, como reveladora do espírito que animou o autor a se lançar em sua empreitada intelectual. A dedicatória, mesmo, vem geralmente nas últimas linhas de apresentação, nas quais o autor invariavelmente agradece ao cônjuge a compreensão e o carinho demonstrados por tanta dedicação ao seu trabalho durante tantas horas roubadas ao convívio pessoal e familiar, acrescentando, se for o caso, dois ou três filhos no seguimento. Discretos esses americanos...
Mais exuberantes são os brasileiros, tanto mais quanto eles não têm ainda uma obra consagrada, e talvez nenhum título digno de Citation Index a oferecer ao distinto leitor. Já reparei que quanto mais elementar é o trabalho em questão – ou seja, partindo de um simples TCC, ou monografia de final de curso, até a tese doutoral completa, passando por diversos tipos de dissertações – mais empolada e grandiosa se apresenta a dedicatória, construída para agradecer a todos os que colaboraram com o formidável produto que agora se apresenta aos olhos do público.

Algumas dedicatórias são sóbrias, comme il faut, fazendo poucas concessões a uma arte tão rica de variações estilísticas e floreios de expressão. Mas as melhores são aquelas que não esquecem absolutamente ninguém na sua sanha abrangente e totalizadora, digna de uma Gesamtkunstwerk, quase uma obra de arte total, como indica o conceito alemão. Elas geralmente começam por Deus, pelo dom da vida, pela felicidade da existência, pela inspiração concedida e por todas as graças alcançadas, e por aí vai. Deus realmente é único e indivisível, pois ele aparece em parágrafo próprio, com o destaque das primeiras linhas, onipotente, sem dividir a frase com nenhum outro personagem das mitologias, sejam elas quais forem.
Depois da invocação divina, o professor orientador é o primeiro personagem obrigatório nessas dedicatórias universitárias, mesmo quando – e sobretudo quando – ele não cumpriu com seus deveres de orientador e deixou passar vários equívocos de substância e erros de forma que depois são detectados por membros menos complacentes da banca (como eu próprio, por exemplo). Em todo caso, o orientador é aquele que mostrou novos rumos, guiou de mão segura o aluno aprendiz pelos tortuosos caminhos da verdadeira ciência, aplicou com toda sapiência os mais rigorosos padrões da pesquisa acadêmica para que o resultado fosse o melhor possível, aquele mesmo que se abre agora aos nossos olhos, eventualmente de arquitetura estropiada em sua forma, conteúdo beirando o aceitável e correção estilística merecendo um revisor bem remunerado. Mas, enfim, orientador é orientador, e cabe-lhe, portanto, as honras e a glória do TCC, da dissertação, da tese tão penosamente construída e finalmente terminada.
Podem vir, em seguida, os demais professores, a instituição, a bibliotecária ou secretária do departamento, enfim, todo o mundinho funcional que circulou em volta do trabalho até que ele viesse a termo. São as honras da casa que é preciso respeitar. Mas esse parágrafo é curto, comparado ao que vem depois.

Sim, depois desses parágrafos protocolares é que aparecem as verdadeiras dedicatórias, aquelas que justificariam uma tese inteira sobre as dedicatórias, essas joias da literatura acadêmica que não mereciam ficar relegadas a páginas introdutórias, pelas quais se passa rápido e sem prestar muita atenção, direto para a consulta do índice e o início da leitura na introdução a obra tão dedicada, justamente.
Nesse setor, a imaginação é o limite, mas o carinho e os agradecimentos costumam estar em primeiro lugar para os pais – se o candidato ainda é jovem – ou para o companheiro, cônjuge, noivo ou namorado, dependendo do status matrimonial, ou pré, do autor em questão. Não são ainda muito comuns as dedicatórias homo-afetivas, mas elas sem dúvida não tardarão, consoante o Zeitgeist e o avanço dos costumes. Também entram aqui irmãos, primos, amigos, companheiros de quarto ou de República, colegas de curso (e das horas de infortúnio), enfim, todos aqueles que, da bibliotecária dedicada ao pipoqueiro da esquina, colaboraram, de uma forma ou de outra, para o sucesso do empreendimento e a conclusão da corveia.

Não são incomuns, tampouco, as citações de terceiros, encimando ou terminando essa página (por vezes página e meia) de dedicatórias: frases cultas, pretensamente inteligentes, invocando alguma nobre missão ou contendo alguma pérola da sabedoria universal; versos poéticos, tiradas filosóficas, mais raramente um hai-kai ou slogan mobilizador. Os marxistas não deixam de destacar alguma frase do 18 Brumário; os neoliberais podem vir com uma resposta hayekiana; os anarquistas aproveitam para relembrar que, a despeito de tudo, permanecem irredutivelmente rebeldes, sans Dieu ni maître; e os sonhadores, ou os muito religiosos, transcrevem uma esperança qualquer. Nunca é tarde, ou cedo, para proclamar em altos brados suas preferências intelectuais.

As dedicatórias são, enfim, o equivalente dos diários íntimos, atualmente tão fora de moda, substituídos, talvez, pelos blogs e outras ferramentas de comunicação social. Elas merecem toda a nossa atenção e espírito investigativo. Vale uma pesquisa mais extensa, para o que pretendo empreender uma garimpagem na coleção de trabalhos acadêmicos depositados em duas ou três instituições universitárias ao meu alcance. Aposto que vou encontrar verdadeiras pérolas, dignas de transcrição entre aspas (preservando-se, é claro, os autores), exemplos de imaginação criadora e espírito literário. Prometo voltar...
Por enquanto, dedico este minitratado a todos os autores sequiosos de colocar em ordem suas respectivas dedicatórias e declarando-me disposto a receber, como contribuição a meu trabalho de pesquisa, todos os exemplos bizarros e mais interessantes que meus leitores possam encontrar em suas andanças acadêmicas. 
Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 15/11/2011; rev.: 18/11/2011)

domingo, novembro 06, 2011

Minitratados: atualizando a lista (e outros a caminho)

Atualizo aqui a lista serial dos minitratados, agregada de mais alguns em relação à lista publicada meses atrás (mais precisamente em Abril de 2011), sendo que tenho dois ou três no pipeline...
Paulo Roberto de Almeida 

Relação cronológica

Atualizada em 5 de Novembro de 2011

Série dos minitratados (até novembro de 2011)

Pouca gente dotada de uma certa familiaridade com a palavra escrita consegue atribuir real importância às reticências, inclusive este cidadão que aqui escreve. Quero falar das reticências stricto sensu, isto é, os famosos três pontinhos ao final de alguma frase ou expressão... (...)
1360. “Mini-tratado das reticências (em defesa de uma inutilidade necessária…)”, Brasília, 28 nov. 2004, 5 p. Argumentos em favor do uso das reticências nas situações de vida. Colocado no Blog Paulo Roberto de Almeida; link: http://paulomre.blogspot.com/2005/12/65-possvel-viver-sem-reticncias.html

Minitratado das entrelinhas (22/01/2009)
Tratados, em geral, costumam ser solenes, como convém aos grandes textos declaratórios, escritos em tom impessoal e devendo refletir alguma realidade objetiva, uma relação entre Estados...
Minitratados, por suposição, deveriam ser versões reduzidas de seus irmãos maiores (...)
1978. “Minitratado das entrelinhas”, Brasília, 22 janeiro 2009, 3 p. Continuidade do exercício anterior sobre as reticências (1360), sob a forma de nova digressão sobre a teoria dos sentimentos morais. Postado no blog Diplomata Z; link: http://diplomataz.blogspot.com/2009/01/14-mini-tratado-das-entrelinhas.html#links

Interrogantes são inerentes à espécie humana, e talvez mesmo a certos primatas. Determinadas escolhas, ou caminhos, nos levam a uma situação de melhor conforto material ou de maior segurança pessoal, sem que, no entanto, saibamos, ou tenhamos certeza, ao início, que aquela opção selecionada é, de fato, a de melhor retorno ou benefício possível. Dúvidas, questionamentos, angústias, em face das possibilidades abertas em nossa existência, são inevitáveis em todas as etapas e circunstâncias da vida. Daí a interrogação, normalmente simbolizada pelo sinal sinuoso que colocamos ao final de certas frases: ? (...)
1988. “Minitratado das interrogações (você tem alguma dúvida a este respeito?)”, Brasília, 8 de março de 2009, 7 p. Continuidade da série dos minitratados, abordando a busca incessante de respostas em face das incertezas da vida. Postado no blog DiplomataZ; http://diplomataz.blogspot.com/2009/03/15-mini-tratado-das-interrogacoes.html#links

O subserviente é aquele que se dobra às conveniências de uma autoridade superior, mesmo quando essa autoridade atua manifestamente em detrimento de seus próprios interesses pessoais; o subserviente prefere submeter-se às inconveniências cometidas por aquela autoridade, e o faz de livre e espontânea vontade, ainda que de modo vergonhoso, a ter de corrigir, mesmo gentilmente, essa mesma autoridade. O subserviente, que também pode ser considerado um sabujo, no sentido estrito, não hesita em desmentir-se, a posteriori, negar declarações suas, previamente tornadas públicas, ou em afastar-se de posições anteriormente assumidas, ou defendidas historicamente, apenas para se conformar à vontade, muitas vezes irracional e inexplicável, dessa mesma autoridade superior. Obviamente, ele não seria subserviente sem essa degradação moral.
2122. “Brevíssimo tratado da subserviência”, Shanghai, 12 março 2010, 2 p. Um raro escrito dedicado a terceiros; homenagem a um personagem por demais presente nos últimos tempos, em várias circunstâncias. Postado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/03/1781-brevissimo-tratado-da.html). Reproduzido no blog Coisas Internacionais (“Ler, Refletir e Pensar” 13.03.2010; Mario Machado; link: http://www.coisasinternacionais.com/2010/03/ler-refletir-e-pensar_13.html). Blog DiplomataZ, 5/11/2011; link: http://diplomataz.blogspot.com/2011/11/brevissimo-tratado-da-subserviencia.html

Há muito tempo pretendia escrever um minitratado sobre o anonimato, mais uma peça de relativa inutilidade substantiva, apenas para me distrair e para fazer companhia a meus outros minitratados (um primeiro sobre as reticências, outro sobre as entrelinhas, um terceiro sobre as interrogações, e um adicional, que aliás não sei se já foi terminado, sobre as exclamações). Não se inquietem os curiosos, pois tenho vários outros no pipeline, ou pelo menos nos meus circuitos mentais, e a coleção deve ser enriquecida com algum besteirol gratificante, cuja única função, pelo menos para mim, é servir a meu próprio divertissement intelectual.
2125. “Minúsculo Tratado sobre o Anonimato”, Brasília, 19 março 2010, 3 p. Antecipando sobre um minitratado, um minúsculo, apenas introduzindo o tema. Blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/03/1886-minusculo-tratado-sobre-o.html); DiplomataZ, 5/11/2011; link: http://diplomataz.blogspot.com/2011/11/minusculo-tratado-do-anonimato-paulo.html

A imaginação não é um simples sentido natural, e sim um ato da vontade, embora não possamos impedir nossa própria consciência de imaginar “coisas”. Mas essas coisas imaginadas são instruídas, orientadas, criadas e administradas por nós, como se fossemos um diretor de cinema ou de teatro, quando eles dizem aos atores como o script deve ser realmente lido e interpretado. (...)
2245. “Minitratado da imaginação”, Brasília, 12 fevereiro 2011, 4 p. Deixando a imaginação correr solta, sonhando acordado. Diplomatizzando, link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/02/minitratado-da-imaginacao-paulo-roberto.html

Não, não quero falar da reencarnação "real", aquela na qual acreditam piamente hindus e tibetanos, pelo menos os religiosos, nisso seguindo, ao que parece, os antigos egípcios, que já não estão mais entre nós para contar como a sua, supostamente rica, experiência nessa matéria. Os primeiros são radicais, capazes até de interromper a construção de um templo por uma minhoca que apareceu no canteiro de obras; afinal, nunca se sabe: pode ser a mãe de alguém. Enfim, se os egípcios ainda nos assustam com múmias de Hollywood, os outros nunca provaram o que afirmam. (...)
2250. “Minitratado da reencarnação”, Brasília, 28 Fevereiro 2011, 4 p. Brincadeiras em torno de um itinerário não muito diferente do que o seguido até aqui. Postado no blog Diplomatizzando, link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/02/minitratado-da-reencarnacao-paulo.html; Blog DiplomataZ: http://diplomataz.blogspot.com/2011/02/minitratado-da-reencarnacao-paulo.html

Uma improbabilidade é algo que, como o conceito indica, não corre nenhum risco de acontecer; constitui, assim, um não-evento, uma impossibilidade prática. Poucas pessoas, salvo as muito sonhadoras, ficam atrás, ou se colocam em busca, de coisas impossíveis, ou seja, de improbabilidades. Aqueles que o fazem, de verdade, ou sinceramente, costumam ser chamados de utopistas, ou talvez até, dependendo da natureza de seus sonhos, de românticos incuráveis. (...)
2257. “Minitratado das improbabilidades”, Em vôo, São Paulo-Chicago, 16-17/03/2011, 4 páginas. Continuidade da série. Postado no blog Diplomatizzando, http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/03/minitratado-das-improbabilidades.html

O que é um desencontro? Dito simplesmente, é uma defasagem, no tempo ou no espaço, entre dois corpos, cada um seguindo vias próprias e diferenciadas, sem qualquer possibilidade de cruzamento. Para fins deste minitratado, no entanto, o desencontro é um descompasso entre dois sentimentos, um pretendendo resposta e reação, o outro permanecendo desatento ou distraído, o que pressupõe alguma instância de reciprocidade ou linha de cruzamento, mesmo virtual. (...)
2261. “Minitratado dos desencontros”, Curitiba- Brasília, 2 de abril de 2011, 2 p. Continuidade da série, com considerações sobre essas situações de frustração. Blog DiplomataZ, http://diplomataz.blogspot.com/2011/04/minitratado-dos-desencontros-paulo.html e Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/04/minitratado-dos-desencontros-paulo.html

10 Minitratado dos reencontros (14/04/2011)
O reencontro pode ser considerado a inflexão da curva de dispersão, ou da linha de divergência, que tinha sido formada, ou que existia, por ocasião do desencontro. Com efeito, o reencontro só se justifica, na maior parte dos casos, após um desencontro ter acontecido, salvo se a separação anterior foi uma obra do acaso, uma contingência inesperada, um acidente de percurso ou seja lá qual fator acidental. (...)
2262. “Minitratado dos reencontros”, Brasília, 14 de abril de 2011, 3 p. Continuidade da série, com considerações sobre essas situações de esperança. Blog DiplomataZ () e Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/04/minitratado-dos-reencontros-paulo.html. Série completa publicada em formato de lista no blog Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/04/minitratados-um-exercicio-ludico.html

Um amigo meu me escreve para dizer que está sendo perseguido por uma poderosa corporação de ofício; enviou-me seu protesto por escrito: “Sou Réu” (até me forneceu o número do processo). Bem, não vou poder ajudá-lo como eu (ou ele) gostaria, pois não tenho esse poder; aliás, nem sou advogado, o que por acaso me lembra que eu tampouco pertenço, profissionalmente, a qualquer uma dessas poderosas organizações dedicadas a preservar o seu monopólio profissional (e, adicionalmente, a achacar consumidores, como eu e você). Sou apenas da modesta tribo dos sociólogos, não tão poderosa nem tão bem organizada quanto a dos advogados, a dos engenheiros, a dos arquitetos, a dos médicos, a dos economistas e as de muitas outras corporações dedicadas ao fechamento dos mercados, de forma a converter todos os demais cidadãos em seus obrigados clientes (mais propriamente em servos indefesos).
2287. “Minitratado das corporações de ofícios”, Brasília, 9 de julho de 2011, 4 p. Continuidade da série, com considerações sobre esses monopolistas de serviços essenciais. Blog Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/07/minitratado-das-corporacoes-de-oficio.html); blog DiplomataZ: http://diplomataz.blogspot.com/2011/07/minitratado-das-corporacoes-de-oficio.html

12 Minitratado do Inusitado (14/08/2011)
O que é o inusitado? Como diz o próprio conceito, trata-se de algo fora do normal, além do padrão costumeiro das coisas, que só ocorre de forma imprevista, em momentos não esperados, como uma surpresa. Diz-se, assim, dos acontecimentos raros, ou mesmo inéditos, que rompem com o processo habitual dos fenômenos correntes, ou de eventos pouco frequentes, que literalmente “caem do céu”, qualquer que seja sua qualidade – boa ou má – e seu impacto circunstancial. Sendo inusitado, sempre haverá um impacto, temporário ou permanente em função de sua intensidade.
2297. “Minitratado do Inusitado”, Brasília, 14 agosto 2011, 3 p. Continuidade da série, com considerações sobre eventos inesperados em nossas vidas. Blogs Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/08/minitratado-do-inusitado-paulo-roberto.html; DiplomataZ: http://diplomataz.blogspot.com/2011/08/minitratado-do-inusitado-paulo-roberto.html

O que pode haver de interessante em certas inutilidades burocráticas, tarefas das quais é preciso se desempenhar mesmo sabendo que elas não servem para literalmente nada, apenas para alimentar o próprio processo burocrático? O que poderia significar de produtivo adentrar num roteiro kafkiano, no qual não se sabe sequer para que servem todos aqueles papéis que se movem de um lado a outro para, ao final, não produzir sequer um grama de valor agregado na formação do PIB nacional?
2326. “Minitratado das inutilidades burocráticas”, Brasília, 9 outubro 2011, 4 p. Continuidade da série, com uma perfeita inutilidade em forma de minitratado. Postado nos blogs Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/10/minitratado-das-inutilidades.html e no DiplomataZ: http://diplomataz.blogspot.com/2011/10/minitratado-das-inutilidades.html

Seguem:
Minitratado do contrarianismo
Minitratado das renúncias inevitáveis
Minitratado da decadência

Pensou num tema relevante? Indique...
Paulo Roberto de Almeida

Brevíssimo Tratado da Subserviência - Paulo Roberto de Almeida


Outro texto que tinha ficado relativamente obscuro, composto a partir de uma percepção longínqua, mas bem informada, sobre essas criaturas que, por oportunismo barato, renegam o que pensam de verdade em troca de ficar roçando no poder. Sempre acontece com pessoas sem caráter, por isso é preciso denunciar, não as pessoas, mas o tipo de atitude
Paulo Roberto de Almeida (5/11/2011)

2122. “Brevíssimo tratado da subserviência”, Shanghai, 12 março 2010, 2 p. Um raro escrito dedicado a terceiros; homenagem a um personagem por demais presente nos últimos tempos, em várias circunstâncias. Postado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/03/1781-brevissimo-tratado-da.html). Reproduzido no blog Coisas Internacionais (“Ler, Refletir e Pensar” 13.03.2010; Mario Machado; link: http://www.coisasinternacionais.com/2010/03/ler-refletir-e-pensar_13.html).

Brevíssimo Tratado da Subserviência
Paulo Roberto de Almeida
(um raro escrito dedicado a terceiros)
O subserviente é aquele que se dobra às conveniências de uma autoridade superior, mesmo quando essa autoridade atua manifestamente em detrimento de seus próprios interesses pessoais; o subserviente prefere submeter-se às inconveniências cometidas por aquela autoridade, e o faz de livre e espontânea vontade, ainda que de modo vergonhoso, a ter de corrigir, mesmo gentilmente, essa mesma autoridade. O subserviente, que também pode ser considerado um sabujo, no sentido estrito, não hesita em desmentir-se, a posteriori, negar declarações suas, previamente tornadas públicas, ou em afastar-se de posições anteriormente assumidas, ou defendidas historicamente, apenas para se conformar à vontade, muitas vezes irracional e inexplicável, dessa mesma autoridade superior. Obviamente, ele não seria subserviente sem essa degradação moral.
O subserviente profissional considera que sua própria sorte, sua sobrevivência funcional, assim como seu futuro destino estão indissoluvelmente ligados ao grau de subserviência máximo que ele conseguir expressar em favor de sua autoridade oficial. Ele pertence, de corpo e alma, quando não de coração e mente, a essa autoridade, à qual ele devota fidelidade canina e pela qual ele está disposto a sacrificar seu conforto pessoal, sua coerência moral (se é que dispõe de alguma) e até sua ética profissional, quando não sua consciência mais íntima (se existir, claro) em favor do bem estar de sua autoridade, tudo isso por escolha própria, não por imposição daquela autoridade. Sua sabujice dedicada é, assim, introjetada, a ponto que ele não mais distingue entre o que humanamente aceitável, e socialmente respeitável, e o que é subserviência pura, sem qualquer hesitação ou exame de consciência. Ele não seria um subserviente perfeito sem essa diminuição intelectual (se o termo se aplica).
O subserviente completo se antecipa, de certa forma, aos problemas que poderiam advir de alguma frase mal posta de sua autoridade. Em consequência de uma circunstância do gênero, ele constrói toda uma teoria justificadora das bobagens superiores com base numa suposta má compreensão por parte dos ouvintes ou interlocutores, imputando aos demais as legítimas dúvidas que estes possam ter em relação às inconveniências do chefe, o que o faz atribuir os equívocos de entendimento aos próprios questionadores. Um subserviente assim tão bem construído é algo raro, mas especialmente valorizado nas situações em que é preciso conter a autoridade numa gaiola de ferro, compatível com a dimensão das bobagens produzidas.
Não é fácil encontrar um subserviente perfeito. Existem muitos, claro, por propensão inata de caráter, mas nem sempre eles são selecionados para servir diretamente uma autoridade, embora alguns se esforcem bastante para conseguir uma tal distinção (se o termo se aplica). Geralmente, um subserviente é construído aos poucos, com a degradação gradual de caráter acompanhando os progressos da carreira, até o ponto em que a subserviência se converte em segunda natureza, algo assim indistinguível das características originais, ou construídas, do personagem em questão. Essa promiscuidade entre o Dr. Jeckyll e Mister Hyde passa então a não mais ser considerada uma alternância de personalidades, mas constitui-se em algo sólido, um bloco unificado que acompanha o novo personagem em toda e qualquer situação de subserviência prática (e as oportunidades são muitas, posto que o subserviente existe sempre em função de uma autoridade medíocre, cuja quantidade, infelizmente, parece se multiplicar ao ritmo da erosão de qualidade das autoridades públicas).
Talvez exista algum manual da subserviência, assim como existem muitos “Idiot’s Guide” para qualquer coisa humanamente concebível, mas não foi possível encontrar algum disponível no mercado, com essa abrangência teórica e essas pretensões práticas. Talvez algum subserviente despertado de sua letargia intelectual possa vir a conceber algum, o que seria útil para todo e qualquer candidato à carreira de sabujo profissional. Não se espera que ele o subscreva em seu próprio nome, a menos que suas deficiências morais e sua total falta de caráter o autorizem a continuar a defender as bobagens de “sua” autoridade, mesmo quando esta deixou de representar poder e prepotência. Afinal de contas, um bom subserviente tem um currículo a defender, mesmo quando este não é o que parece, ou aquele que é proclamado.

Shanghai, 12.03.2010